segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Hildegarda

Vou-vos falar de Hildegarda.
Porquê?!
Bem... Para começar porque é por ela que aqui estou. E depois, porque me apetece! Sabem...
Como hei de dizer isto?
Isto da eternidade é uma seca! Às vezes adorava ter-me esfumado, volatilizado, no espaço etéreo. Mas não... Fui puxado para esta prisão demoníaca disfarçada de jardim às portas do paraíso.
Sim! Eu vejo o paraíso daqui da Torre. Daqui do alto, por entre as grades de ferro, vejo o portão do Céu. Mas não é para lá que eu vou... Estou certo disso!
Não sou como esses palermas saltitantes que esvoaçam lá em baixo como se fossem anjos. Julgam-se perto do prometido Céu... Apetece-me gritar-lhes que se desiludam! O sistema não está feito para isso...
Por aquele portão só passam os santos. Os outros, por muito que se esforcem, nunca passarão de almas bondosas, seres de muito boa vontade que terão de se contentar com Belazir enquanto esperam por uma nova oportunidade de se redimirem. Alguns...
Bom... Se calhar todos esses idiotas que lá de baixo olham para as Torres temerosas, receando os que lá estão, imaginando que todos eles cometeram pecados inconfessáveis, horríveis; talvez todos eles se bem digam por não estarem aqui onde eu estou. Enfim, as Torres são, no folclore de Belazir, a versão suave do Inferno.
Mas eu ia falar-vos de Hildegarda...
Hildegarda era uma deusa entre as mulheres! Era aquele tipo de rapariga que só se via nas revistas. Tinha o porte de uma guerreira do norte da Europa... Mas era tímida.
Eu sei que é difícil de acreditarem. Eu também tive dificuldade em acreditar quando ela falou comigo. Comigo! Um pobre rapazola a quem ninguém ligava, que passava as horas esquecidas num canto do refeitório ou mergulhado de cabeça nalgum livro chato que ninguém lia...
Perguntou-me se podia sentar-se ao meu lado. Eu disse-lhe que sim, enquanto ganhava coragem para me beliscar.
É que eu estava a ter aquilo que muitos dos garanhões da escola queriam: a atenção de Hildegarda. E a ironia é que eu nem tentara nada... Os outros quase que se matavam para obterem um sorriso... Mas eu, que me achava desengraçado, nada fizera e nem coragem tinha de olhar para ela.
Hildegarda apresentou-se. Eu olhei em volta, tinha o refeitório inteiro a olhar para mim; gaguejei e disse-lhe o meu nome à terceira vez. Ela riu-se da minha timidez, encolheu os ombros e começou a comer.
Eu continuei a minha refeição. Nervoso, é claro! Tinha Hldegarda na minha mesa, a Hildegarda falara comigo e sorrira-me! Sentia o estômago embrulhado. Se por um lado achava que aqueles tinham sido os meus segundos de fama, o momento em que fora melhor que todos os outros, e que nunca mais iria ouvir a voz dela, por outro pensava que deveria fazer mais alguma coisa, aproveitar aquela oportunidade de ouro...
Infelizmente fiquei-me pela ideia de que aquele momento fora um sonho maravilhoso e que Hildegarda nunca mais falaria comigo...
Mas depois ela fez-me outra pergunta. Perguntou-me se eu me importava de a ajudar nalgumas matérias. Pensei que me ia passar! Mordi os lábios... Era evidente! Ela precisava de ajuda para estudar. Era só por isso que ela procurara o marrão da escola... Tive vontade de a mandar à fava! Todavia houve alguma coisa no seu olhar, no seu sorriso, que me deteve...
Não sei explicar. Na altura pareceu-me que estava envergonhada...
Perante o meu silêncio, Hildegarda disse qualquer coisa sobre as pessoas estarem a olhar e levantou-se. Nesse momento, um momento que jamais irei esquecer, percebi que aquela aproximação estava ser tão difícil para ela como seria para mim, pelo que decidi que Hildegarda estava a ser sincera. Enchi-me de coragem, segurei-lhe a mão – juro que nesse iato de tempo o mundo parou - e disse-lhe que a ajudava com muito gosto.
Quando acabamos a refeição já conversávamos mais a vontade.
Hildegarda não era estúpida. Existe o preconceito de que as mulheres bonitas não têm miolos, mas para enfatizar as diferenças entre Hildegarda e o estereotipo, ela era muito inteligente. Tão inteligente que eu nunca mais deixei de estudar com ela e ela comigo.
A convivência fez-me bem. Eu tornei-me.... Não posso dizer bonito, porque não há milagres! Mas transformei-me num rapaz interessante com quem as raparigas gostavam de conversar.
Fomos para universidades separadas e...

Depois vim a descobrir que ela andava com um tipo, tipo aqueles tipos com quem andam as mulheres das revistas: os fanfarrões, desportistas...
Não me contive e fui visitá-la.
Ela recebeu-me de braços abertos. Senti que tinha saudades minhas...
Mas depois expulsou-me. Esforçou-me por me magoar e ofender... Voltou e empurrar-me para dentro do armário de onde me tinha tirado, como se nada mais fosse do que um brinquedo velho!
Fiquei destroçado!

Hildegarda morreu nos meus braços...
Numa manhã fui ter com ela para lhe dizer como estava magoado, e acabei por impedi-la de cair no chão quando o fanfarrão do namorado a esbofeteara.
Hildegarda não acordou.

Eu... Não sei. Nunca percebi porque razão ela me tratara assim. Calculei que tivesse sido por culpa daquele animal. Calculei, não! Tinha a certeza, a mesma certeza que tivera quanto à sinceridade de Hildegarda quando ela me procurara, anos antes, no refeitório. E talvez tenha sido por isso que fiz o que fiz...

Ainda não me recordo bem... A última coisa que me lembro é do calhou enorme nas minhas mãos salpicadas de sangue e do crânio daquele desgraçado esmigalhado. Depois...

Atirei-me para a frente de um comboio!

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Pressa

Foi com voracidade que me tornei adulto. Com aquela pressa que se tem de chegar ao futuro, ignorando que depois de lá estarmos desejaremos... Mas desejaremos com um ardor muito maior, com uma sofreguidão angustiosa, com uma saudade incompreensível... Desejaremos voltar atrás, aos tempos de criança, só que... o tempo não volta atrás. Não. Não volta! É uma impossibilidade física! Pelo menos foi o que sempre me disseram...

No entanto, eu sei que volta. Eu voltei! Cá estou eu no mesmo sítio, no mesmo tempo... Bem! Talvez não. Em Belazir não há tempo! Pelo menos o conceito de tempo a que os terrestres conhecem. Por isso, não poderei dizer que estou no mesmo tempo em que estava quando cá estive da última vez. Penso que seja essa uma das vantagens que a eternidade oferece...

Sei que vou passear muitas vezes por estes jardins repletos de flores, cheios de aroma, que vou encontrar outros como eu com quem irei conversar alegremente, que irei inspirar as essências libertadas pela terra molhada numa tarde de chuva, um perfume inigualável em qualquer lado do universo...

Mas sei também que haverão dias cinzentos, dias em que só me apetecerá enterrar no chão, em que chorarei e lamentarei os meus erros... Os meus erros consecutivos... A minha estupidez inata! Sim, porque só alguém dotado de extraordinária estupidez repete os mesmos erros vida atrás de vida.

Por vezes, sinto-me preso neste ciclo da vida eterna, Belazir-Terra , Terra- Belazir...

Pelo menos os meus erros não são graves como os daqueles que estão encerrados nas Torres. Eu não erro por vontade... Erro por... por... Por estupidez! Não encontro melhor definição!

Em todas as minhas vidas tenho pressa de crescer, pressa de me tornar homem, ou mulher, pressa de viver. E quando lá chego, cheio de dúvidas, de medos, sem estar devidamente preparado para o que é ser adulto começo a querer ser de novo criança, regressar à vida despreocupada, esse é o primeiro sinal...

O primeiro sinal que em breve regressarei a Belazir, o primeiro sinal de que voltei a errar, que voltei a esgotar as minhas energias para tentar acelerar o tempo, para chegar mais depressa à idade adulta – ignorando outra impossibilidade física na Terra: o tempo tem o seu próprio tempo.

Depois virá a doença inexplicável... De repente, do nada, serei acometido de uma terrível enfermidade... À medida que as minhas energias espirituais se forem findando, irei definhando até que um dia a vida soçobrará num misericordioso suspiro fatal...

Então estarei de regresso a Belazir...

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Simplesmente sei...

Já não penso no porquê. Cansei-me! E a eternidade é demasiado tempo para se pensar sempre na mesma coisa. Rendi-me ao evidente: terei de começar de novo.
Os meus únicos entreténs são a janela gradeada e ela.
Da janela gradeada vejo ao longe o horizonte. A serra colorida contrastando com o céu azul.
O céu ali era sempre azul... Apareciam algumas nuvens, muito de tempo a tempo: chuviscava um pouco durante meio dia e depois o sol voltava. Não era um sol quente, mas um sol reconfortante.
Talvez fosse por isso que tudo ali floria, desde a planta mais simples à flor mais chamejante.
Tenho pena que aquilo apenas esteja ao alcance do meu olhar... Contudo, até ontem, não me sentia culpado por isso. Cultivava até alguma raiva contra o mundo, porque considerava uma injustiça o que me acontecera. Como poderiam esperar que eu não errasse se me obrigavam a esquecer tudo o que aprendera? Ter de voltar um dia e passar por tudo de novo... Para quê? Para voltar para ali?! Para passar mais uma parte da eternidade num calabouço e desejar ridiculamente que chegasse aquela hora do dia, aquele momento em que ela vinha...
Todos os dias uma rapariga muito bonita e alegre aproximava-se dos muros do Cárcere. Nunca lhe perguntara o nome, não parecia ser importante. Conversavam longas horas... Conversavam sobre tudo e sobre nada. Era o momento alto do dia.
Ela já não viria mais...
«Vou encarnar numa linda bebé!», dissera-lhe feliz.. «Não tens medo de errar, novamente?», perguntei-lhe de imediato, e fi-lo porque tinha muito medo de errar mais uma vez e, simplesmente, não sabia como evitá-lo. A resposta dela deixara-o estupefacto: «Só tenho de saber seguir a minha intuição, escutar a vozinha da consciência. Nós nunca esquecemos aquilo que aprendemos, apenas está adormecido numa parte do cérebro humano. Se soubermos escutar-nos teremos sempre sucesso.». E partira com um sorriso enorme no rosto...
Fiquei triste, sozinho de novo, apenas com a paisagem que só os meus olhos podiam tocar, como agora o faziam. Talvez ela tivesse aprendido a lição... Eu continuo sem saber, em concreto, aquilo a que ela se referia. «Vozinhas ?! Deixa-me rir!».
Mas sinto-me de novo com esperança, algo renasceu em mim, porque sei, simplesmente sei, que ela tem razão...

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

A Boa Acção

Parecia ter sido ontem que tudo acontecera. A má disposição repentina que a obrigara a levantar-se da mesa onde almoçava, a correria atrapalhada até à casa de banho a que não chegara, o cambalear incerto e lento apoiado nas paredes que lhe pareciam tão distantes, os sons que se iam finando devagar, tão devagar como a sua visão se turvava e a sua boca secava... Ainda se lembrava do som que fizera ao cair no chão frio e de onde mais não se levantara.

Depois fizera-se silêncio, nenhum ruído perturbava a negridão que a envolvera. Nada via a não ser escuro, tudo desaparecera e pairava no vazio. Sentia, ainda assim, um medo horrível de cair, apesar de não saber se estava em algum lugar realmente ou se estava em nenhures – se esse local existisse, decerto seria ali! As emoções que começaram a agitar-se dentro de si, naquele frenesim que atacava antes do pânico, lançaram-na num turbilhão de dúvidas e conjecturas... E fora então que percebera, pela primeira vez, que estava diferente, e que sentira a falta de uma coisa que todos os dias tivera e nunca dera o devido valor, que desde o primeiro dia da sua vida a acompanhara incondicionalmente, uma coisa que era tão presente que nunca parara para pensar nela, um órgão do seu corpo: o coração. O seu coração não batia acelerado como seria suposto numa situação daquelas, de alta ansiedade... Na verdade, nem o seu cérebro estava tolhido de racionalidade conforme era habitual em casos de stress; nem o seu corpo transpirava do medo que tinha; nem a adrenalina bombeava pelas veias para lhe dar a energia necessária para agir; a bem dizer, nem o sangue corria...

E isso era possível! A sua mente estava arguta como nunca e sabia bem o que sucedera. Não havia sangue nas suas veias, nem adrenalina, porque já nada poderia ser feito. Estava morta! E ali onde estava não tinha corpo... Por isso, pensara, também não seria importante saber se estava parada, ou não; se pairava no ar, ou se estava assente nalgum lado. Na realidade, ser-lhe-ia indiferente, julgava, estar a viajar à velocidade da luz, facto que não poderia comprovar dada a ausência de referenciais de movimento, ou quieta. Era tudo preto, negro, trevas... Imaginava que apenas teria de esperar.

De repente sentiu-se esmagada!

Juraria ter ido ao encontro de uma parede, ou batido no fundo de um poço. Fora como se todo o seu corpo, que não existia, se tivesse espalmado contra um objecto que inesperadamente surgira no caminho. Não sentira dor nenhuma, somente um pequeno desconforto, seguido de uma sensação clara de transmutação... Estendeu aquilo que entendia por serem os seus braços na direcção do obstáculo e fora sugada em direcção à luz.

Levara algum tempo a habituar-se àquela nova realidade, àquela sensação de liberdade, ao facto de não ter limitações físicas que a impedissem de fazer o que quisesse. E nos primeiros tempos andara deslumbrada com o novo mundo, com aquilo que descobria que sempre soubera, mas, como por artes mágicas, nunca se lembrara durante a sua vida. E isso era de lamentar, porque concluía que tinha conhecimentos a que jamais teria acesso quando vivia: factos sobre os mundos, sobre as estrelas e sobre os seres...

Todavia, conforme lhe haviam explicado, segundo eles pela 14ª vez, não era suposto viver-se com todo o conhecimento que se tinha na realidade, porque a vida era um conjunto de desafios, uma jornada, que teria de ser feita à custa da aprendizagem constante, um aprendizagem que, por vezes, significava ter de aprender de novo algo que sempre se soubera. Tudo em nome da humildade, da caridade, da honestidade, da fé...

Aquilo pouco lhe importava. Não percebia porque razão sempre que voltasse à vida teria de aprender que 2+2=4; e muito menos o que é que isso tinha a ver com aqueles valores enunciados. Para já, porque entendia que tinha de ir passo a passo, bastava-lhe perceber que depois da vida na Terra tinham aquele período de recobro até que mais tarde voltassem a reencarnar. Preocupar-se-ia com essas questões quando chegasse essa altura! Agora queria era voar, espalhar-se pelos céus azuis, dominar a sua forma etérea, muito mais bela do que as mais belas das mulheres de que se lembrava da sua vida. Uma vida que não fora difícil. E até considerava ter gozado bem a vida até ao dia em que morrera - uma morte estúpida, por sinal!

Como teriam ficado os seus familiares? E os seus amigos?

Fora tão repentina a sua chegada ali que nem parara para pensar naquilo que deixara. E agora que pensava nisso, constatava que aquela sua vida estava a tornar-se numa memória distante, numa lembrança, como todas as outras vidas que tivera, num momento que poderia ser comparado a um dia da vida humana. Não deveria apoquentar-se com aquilo! Tinha apenas que deixar vir ao de cima o ser que era, com a sapiência que tinha... E isso levaria tempo, coisa que, segundo eles, já haviam explicado, também, por 14 vezes!

- Criança! – a voz bradava-lhe de todos os lados – Precisamos de conversar!
- Quem és? Onde estás?
- Eu sou quem sou. E estou em todo o lado, por aqui!
- Estou a falar com Deus?

A voz silenciou-se por breves instantes...

- Acreditas em Deus, Criança?
- Estaria aqui, se não acreditasse?!
- Poderias estar, ou não.
- Que me queres?
- Onde pensas que estás, Criança?
- No Céu...

A voz voltou a calar-se.

- Estás em Belazir!. – anunciou passado algum tempo – Não é o Céu!
- Então é o quê? O Inferno?

A voz riu.

- Não. Também não é o Inferno!
- É o quê?
- É uma passagem...
- Quer dizer que ainda tenho uma viagem para fazer?
- Não! A tua viagem, por enquanto, finda aqui, Criança!
- Não vou para o Céu?
- Não!

Ela deixou a sua forma etérea descer até ao chão firme de Belazi, como se o peso daquela resposta tivesse sido demasiado para que se mantivesse a flutuar. Estava longe da povoação. Alargara-se no seu voo e fora até aos campos de flores e densos arbustos perfumados. Ao longe ainda avistava as duas grandes torres de Belazir e os contornos de todas as casas, e se buscasse no horizonte, do lado oposto, veria as serras recortadas no céu. Era tudo tão lindo que, depois de ter percebido que morrera, sempre pensara estar no céu. Mas não estava e isso, não percebia porquê, deixava-a triste. Muito triste. O que é que fizera de errado?

- Criança! – voltou a bradar a voz - Não é agora que deves lamentar!
- Lamentar o quê? Onde é que eu errei?
- Não se trata de errar...
- Não!? Sempre me ensinaram que quem faz mal vai para o Inferno, e só os bons vão para o céu. Quem é que vem para Belazir?
- Quem não cumpre as regras.
- Quais regras? Aquelas que não é suposto nós lembrarmo-nos?!
- Sim. É por isso que a Vida é um desafio, uma jornada de descoberta, aprendizagem e fé!
- E eu errei onde?

A voz resmungou.

- Já te disse que não erraste, Criança! Quem erra está preso naquelas Torres que vês daqui. Tu estás livre e se te portares bem terás direito a uma casinha na povoação...
- O que é que eu fiz?
- Todos nós temos um número máximo de Boas Acções e Más Acções para praticar na Vida. Quando esse número é ultrapassado: soa o gongo!
- E depois!
- Depois nós reunimo-nos para tomar uma decisão...
- Não acho justo que joguem com a vida das pessoas assim!

A voz resmungou de novo.

- A Vida é uma passagem. Isto é que é a Verdade! – pareceu-lhe sorrir – Além disso nós avisamos...

Lembrou-se de repente. Naquela manhã, no dia em que morrera, quando saíra de casa, tivera a sensação de que nunca mais iria voltar. Sentira um vazio tão grande dentro dela, uma saudade repentina, que até telefonara aos pais, apenas para dizer que gostava muito deles...

- Pois é, Criança! – exclamou a voz ao ler-lhe os pensamentos – Tu sempre soubeste o que te iria acontecer. A tua Fé estava lá, apenas te faltou a humildade e a honestidade para o admitires.
- Quer dizer, então, que falhei, Senhor?
- Não. Não falhaste... Quebraste uma regra. E não me chames Senhor, porque eu sou apenas o teu carcereiro. Não sou Deus!
- Carcereiro?! Estou presa?!
- Não cumpriste a lei...
- Qual foi a má acção com que eu ultrapassei o plafond?

Perguntou com alguma ironia

- Lembras-te da tua última noite?

Fez algum esforço. Não se recordava de ter feito nada de errado. Jantara com os pais e depois fora ao cinema com uma amiga... No regresso apanhara um taxi. O homem não se calava com a dificuldade da vida, com os filhos que só lhe davam problemas, não queriam estudar e só queriam andar na vadiagem, com a mulher que era tão ciumenta que achava que não tinham dinheiro, porque ele o gastava com outras mulheres. Ficara com tanta pena do homem que quando ele a deixara à porta de casa, dera-lhe 20 € para pagar 7.50€ e oferecera-lhe o resto de gorjeta.

- Não me lembro de ter feito nada de mal... – disse por fim
- E quem te disse que foi uma Má Acção, Criança?

segunda-feira, 27 de julho de 2009

Manifesto


Este Blogue destina-se a contar histórias. Não irão encontrar nele comentários sobre a actualidade, problemáticas existenciais sobre o ser ou não ser, questões importantes, ou não, para alguns, ou mesmo para todos. Neste blogue irão contar-se histórias, ou estórias, como preferirem, por isso serão histórias que nele irão encontrar. Histórias de seres, de pessoas, de almas, que poderão, ou não, reflectir o vosso estado de espírito, as vossas angústias, os vossos medos... E se for esse caso, deverei, desde já, avisar-vos que qualquer semelhança será mera coincidência. Desafio-vos a conhecerem o Cárcere de Belazir...